A exposição às radiações de telefones celulares consideradas inócuas ao organismo, na verdade provoca modificações nas células e no DNA, segundo os resultados do Projeto Reflex, que durante quatro anos integrou 12 equipes de sete países. A diretora da equipe espanhola, Angeles Trillo, explicou que, apesar dos resultados, o estudo não terá continuação por causa de uma decisão de seu financiador, a Comissão Européia (CE), órgão executivo da União Européia (UE).
"Não está claro o por quê. A UE estabelece suas prioridades, mas há muitos fatores envolvidos. Não há como não pensar que há pressões para que estes estudos não continuem, uma vez que podem gerar uma preocupação social muito grande", denunciou.
Na opinião de Trillo, é incontestável que os telefones celulares "são muito utilizados", "têm efeitos biológicos em nível celular e molecular" e precisam continuar sendo alvo de estudos.
O pesquisador Alejandro Ubeda, membro da equipe espanhola, explicou que o trabalho revela que as radiações dos telefones celulares provocam mudanças nas células, embora não estabeleça qual mecanismo dá origem a este processo, cujas pesquisas a respeito não poderão prosseguir devido à falta de recursos.
"Acho estranho que após estes resultados, que apesar de não indicarem nada nocivo, demonstram que há um efeito por trás dos limites considerados toleráveis, (os estudos) não sejam aprofundados, que a pasta seja fechada e que sua continuidade não seja financiada".
A reação das células, ressaltou Ubeda, não se deve apenas ao calor gerado pelas microondas, "mas por algo a mais", cujo mecanismo ainda "é desconhecido".
Os participantes do Projeto Reflex, cujos resultados acabam de ser enviados à Comissão Européia, estudaram desde fevereiro de 2000 até maio deste ano os efeitos sobre as células dos campos eletromagnéticos de ambientes urbanos industrializados, utilizando para isso material de laboratório.
Os pesquisadores analisaram dois tipos de campo: os de baixas freqüências, ou seja, com freqüências iguais ou inferiores a 50 hertz, que são as emitidas pelos computadores ou pelas linhas de alta tensão; e os de altas, com freqüências iguais ou inferiores a 1 gigahertz, que são as microondas da telefonia celular, tanto das antenas repetidoras quanto dos aparelhos.
"Se o celular só recebesse não haveria problema; o problema é que (o aparelho) emite (ondas) e nossa cabeça está no meio", resumiu Ubeda, especialista em biofísica e membro da equipe de bioelectromagnetismo do hospital Ramón e Cajal de Madri. O Projeto Reflex estudou apenas os níveis iguais ou inferiores aos considerados seguros para o público em geral, e dentro destes limites biofísicos houve resposta celular.
Cada grupo de trabalho se encarregou de uma parte. Os 12 grupos participantes analisaram células-tronco procedentes de ratos, células cancerosas cultivadas em laboratório e células sanguíneas de voluntários humanos.
"Aí a resposta foi diferente conforme a idade dos doadores: quanto mais velho era o indivíduo, mais modificação celular havia", disse Ubeda.
A pesquisa, acrescentou o especialista, está pronta para ser retomada, mas apenas com grupos de células, não com humanos ou animais. Em suas conclusões, o Projeto Reflex recomenda que não se abuse do celular, principalmente os jovens.
Ubeda, que tem e usa telefone celular, só põe o telefone na orelha quando já estabeleceu uma conexão com seu interlocutor, de modo que evita "o pico máximo" de ondas. Além disso, evita falar onde há pouca cobertura, porque é nestes locais em que o sinal tem mais intensidade.
Fonte: Tribuna da Imprensa
23/12/2003