A tosse incomodava o pedreiro Rogério, 30 anos, há pelo menos seis meses. Apesar disso, ele não pensava em procurar um médico. Acreditava que o sintoma fosse uma reação natural do corpo ao vício do cigarro. O homem só se consultou com um especialista quando passou a ter febre e cansaço físico intensos, em março de 2005. Desde então, ele luta contra a tuberculose. "Não sabia que uma simples tosse pudesse ser o principal sintoma de uma doença séria", lamenta. A Secretaria de Saúde do Distrito Federal acredita que muitos brasilienses pensem como Rogério. E para evitar que o desconhecimento e o preconceito produzam mais diagnósticos tardios, o órgão lançou a campanha Vigilantes da Tosse.
O projeto surgiu a partir de debates entre as 15 regionais de saúde do DF. A troca de experiências revelou dois problemas enfrentados por médicos e enfermeiros: a pouca importância que as pessoas dão à tosse e o preconceito em relação à tuberculose. Segundo a responsável pela gerência de Doenças Crônicas e Outros Agravos Transmissíveis, Rosa Nancy Urribarri, os pacientes ficam envergonhados diante da possibilidade de terem a doença. "A tuberculose ainda é cercada de estigma. Por isso, pensamos em como sensibilizar a população para a doença, mas sem assustá-las", conta. Em 17 de março, uma semana antes do Dia Mundial de Combate à Tuberculose, a campanha Vigilantes da Tosse entrou em ação.
O segredo do projeto é deixar o paciente mais à vontade e evitar a palavra tuberculose em qualquer momento antes do diagnóstico. Faixas pregadas nas paredes dos postos de saúde incentivam pessoas com tosse há mais de três semanas a procurar os vigilantes da tosse. Até o nome do consultório onde os exames são feitos mudou de nome para driblar o constrangimento. "Para muitos era embaraçoso perguntar onde ficava a sala da tuberculose", explica Rosa Nancy, que é pneumologista. "Todos os centros de saúde receberam adesivos novos, com o nome Sala dos Vigilantes da Tosse."
A preocupação da Secretaria de Saúde com a tuberculose se justifica em números. O Brasil está entre as 22 nações com a maior incidência de tuberculose no mundo. A cada ano são registrados 85 mil novos casos no país e, anualmente, 6 mil pessoas morrem vítimas da doença. No DF, o número de pacientes com tuberculose diminuiu de 2003 para 2005. Até outubro do ano passado foram registrados 352 casos com 15 mortes (confira quadro). Dados da secretaria apontam que em cada 100 pacientes com a tosse prolongada, quatro podem ter tuberculose. E, sem tratamento adequado durante cinco anos, 75% dos doentes morrem.
Medicamento
O exame para detectar a tuberculose é simples, feito com o escarro do paciente. O tratamento, no entanto, é mais trabalhoso e exige disciplina. Para curar a tuberculose é preciso tomar três medicamentos durante seis meses. Se o tratamento não é feito da forma correta, ou se é interrompido antes do tempo, a doença pode voltar com mais intensidade. O paciente precisará de uma quantidade maior de remédios, já que a eficácia deles diminuirá. Por outro lado, com um tratamento correto, as chances de cura superam 98% dos casos.
Rogério se arrepende de não ter levado a sério as orientações do médico. Ele ficou sem os remédios necessários durante uma semana. A pausa foi o suficiente para o bacilo causador da tuberculose, o Mycobacterium tuberculosis ou bacilo de Koch, ficar mais resistente. Há um mês, o pedreiro começou um novo tratamento, mais agressivo. "Se antes eu tomava seis comprimidos por dia, agora tomos 10, além de uma injeção. O primeiro tratamento duraria seis meses. O atual vai demorar 18 meses para terminar", desabafa. "O pior não chega a ser os remédios. Ruim mesmo é o preconceito que as pessoas têm. Quem sabe que tenho tuberculose não chega muito perto, não pega nem na minha mão", detalha o pedreiro.
O professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília, Ricardo Martins, explica que o preconceito é desnecessário. Apesar de ser uma doença transmissível, depois de 14 dias de tratamento a tosse da pessoa infectada deixa de contaminar. "Mas mesmo antes disso não há necessidade de isolar o paciente", ressalta o pneumologista. "Vale os cuidados básicos: não tossir em direção ao rosto de outra pessoa, não ficar em locais muito fechados."
De acordo com o médico, a tuberculose se aloja no pulmão em 80% dos casos. O paciente tosse muito, tem febre, perda de peso e suores intensos. Porém, a doença também pode se instalar em qualquer outra região do corpo. "Além dos sintomas gerais, o paciente apresentará uma deficiência específica do órgão atacado pela doença. Se for uma tuberculose renal, por exemplo, a pessoa terá infecções urinárias", informa Ricardo Martins.
Previna-se
Procure pelos Vigilantes da Tosse caso esteja com tosse há mais de três semanas. Eles estão no posto de saúde mais próximo de sua casa. Mais informações pelo telefone 160 (Disque-Saúde).
Fonte: Correio Braziliense
11/04/2006